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quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

A CONQUISTA DA CLASSE C – Parte I



O PT venceu as eleições de outubro/2014 contra todo o poderio econômico e midiático da elite e da classe média alta. Venceu com a força do povo. Bela frase de efeito. Mas... quem é esse povo?
Lendo Rudá Ricci 1, (e aqui recorro a artigo de 2010) posso concluir que há cada vez menos povão e mais classe média. Ricci informa que os brasileiros com “renda mensal entre R$ 1.064 e R$ 4.591 2” já eram quase 92 milhões de pessoas naquele distante 2010. Entre 2004 e 2014, 51 milhões de pessoas mudaram de classe social para posição superior à que se encontravam antes.
A ascensão ocorreu em todos os estados brasileiros, mas o avanço foi mais veloz para os moradores do campo 3 do que os residentes nas cidades, mais no Norte e Nordeste do que nas outras regiões do país. Esse movimento foi causado, segundo Ricci, muito mais pela recuperação do salário mínimo do que pelos programas sociais, como o Bolsa Família.
Essa classe alcançou um padrão de consumo para seus filhos ao qual os pais não tiveram acesso na mesma idade: cursos técnicos e universitários, o PROUNI e o PRONATEC, poder de compra que trouxe para dentro de casa móveis e eletrodomésticos novos, computadores, tablets e smatphones, TV por assinatura, carrinhos bem mais cheios no supermercado e, em muitos casos, planos de saúde.
Com informações do texto “45 Curiosidades sobre a Nova Classe Média” 4, podemos afirmar que o poder de compra da nova classe média é de 46,24%, superando a classe alta; que a maioria de seus componentes é jovem e negra; seus jovens tem maior escolaridade que os pais, são conectados e se transformaram nos formadores de opinião de suas comunidades em um ambiente no qual há mais confiança na informação de parentes e conhecidos do que nos meios de comunicação.
Do mesmo texto extraímos que a nova classe média cultiva os valores do trabalho e do esforço próprios, deseja respeito, “têm a ambição de "subir na vida", viver melhor, consumir mais e, portanto, aprender e se qualificar a fim de gerar a renda consentânea com essa forma de viver. (Bolívar)5 e está migrando da saúde e educação públicas para os planos de saúde e as escolas particulares.
O texto apresenta uma definição básica do imenso grupo social:
O mundo dessas pessoas ainda é pequeno, restrito à família, ao bairro, às suas preocupações mais imediatas. Ela pretende que a sociedade e o Estado lhe deem mais daquilo que já tem, mas não realidades, propostas e possibilidades diferentes. É religiosamente também conservadora, no sentido de que ainda mantém os laços religiosos provindos, na sua maioria, de igrejas evangélicas. Por isso mesmo são conservadoras também. Muitos são o primeiro universitário da família. Escolhem a faculdade de grife, mas que não seja muito cara, um curso não muito exigente, mas aquele que foi possível entrar. Muitos não se envolvem com o ambiente universitário, mas querem ter o diploma. Ainda não viram muita efetividade em uma escolaridade maior. Interessante é que muitos não têm ainda segurança nessa nova posição. Estão endividados, não têm perspectiva de futuro muito clara, e os laços anteriores, que são sua rede de sustentação, se mantêm. Essa rede é representada pelos hábitos, pela cultura, pela religião e pelos relacionamentos comunitários do seu bairro. (Jorge Cláudio Ribeiro)

A ascensão dessa multidão criou um mercado consumidor nacional capaz de sustentar e salvar o Brasil dos piores efeitos da crise internacional iniciada em 2008 e ainda não superada totalmente. Enquanto países como Portugal e Grécia foram ao fundo do poço das políticas neoliberais, e a Espanha amargou um desemprego superior a 20%, nossas taxas de desemprego vêm caindo ano a ano, chegando a 2014 com os menores números da História.
Assim sendo, não é de se estranhar que essa classe tenha votado majoritariamente no PT nas últimas 3 eleições presidenciais, em especial os que vivem no Norte e Nordeste do país, onde as conquistas sociais tiveram efeito mais visível.
Na eleição de 2014, porém, um sentimento de mudança predominou, mesmo entre essa classe, nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, exceção feita ao RJ e MG.
Se, em números totais, a Presidenta Dilma obteve mais votos nessas regiões (54,82%: 29.875.512,8) do que no Norte e Nordeste (45,08%: 24.569.103,9), em termos percentuais a votação foi bem inferior a de seu adversário (57,5% x 42,5% pró Aécio no Sul/Sudeste/Centro-Oeste e 64,11% x 35,89% pró Dilma no Norte/Nordeste), mostrando que o discurso da oposição avançou na classe que teria menos motivos para desejar a volta das políticas neoliberais do governo Fernando Henrique. Por que isso ocorreu?
As características da chamada Classe C, que vimos acima, tais como valorização do esforço próprio, busca de melhor qualificação, etc, pode ter encontrado eco, dentro das grandes cidades, na pregação oposicionista, que buscou, em princípio, demonizar os programas sociais, taxando-os de esmola. A ideia de uns trabalharem enquanto outros recebem ajuda vai na direção contrária ao esforço do self-made-man tupiniquim. E a corrupção mais ainda.
Evidentemente essa apresentação é distorcida e mesmo mentirosa, mas aqui entram em cena os outros fatores que, a nosso ver, foram muito mais importantes para determinar o voto oposicionista nas três regiões Centro-Sul do Brasil e sobre os quais vamos discorrer separadamente:
  1. Desinformação ou distorção da informação proposital pela mídia;
  2. Acesso ainda limitado aos meios de informação alternativos;
  3. Falha na comunicação do governo;
  4. Ausência de políticas que aprofundem e garantam as conquistas da nova classe;
  5. Permitir, por ideologia, que a direita assuma totalmente a guarda de algumas bandeiras que encontram penetração em uma parcela significativa da população;
  6. Inação política, falta de reformas sociais;
Nas próximas semanas vamos escrever propostas sobre como atacar cada um destes itens. Não se trata evidentemente de propostas peremptórias, mas de ideias para serem debatidas, aperfeiçoadas e, quem sabe, levadas a conhecimento de quem pode fazer alguma coisa.
Como os três primeiros itens estão relacionados, vamos tratá-los todos no próximo texto. Clique aqui.
Continua...
1Sociólogo, Doutor em Ciências Sociais, do Fórum Brasil de Orçamento e do Observatório Internacional da Democracia Participativa.
2RICCI, Rudá. O Maior Fenômeno Sociológico do Brasil: a nova classe média. Escola de Governo.
Disp: http://www.escoladegoverno.org.br/artigos/209-nova-classe-media - 27/10/2014
3Dados extraídos da reportagem é de Mauro Zanatta e publicada pelo jornal Valor, 21-12-2010. Disponível em:
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/noticias-anteriores/39469-renda-sobe-e-classe-media-vira-maioria-no-campo - 27/10/2014
4http://www.sae.gov.br/novaclassemedia/?page_id=58 - 27/10/2014

5http://www.sae.gov.br/novaclassemedia/?page_id=58 - 27/10/2014

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