https://www.pinterest.com/pin/527202700098820745/ |
MANIFESTO PELA TOLERÂNCIA
Fui
vítima de uma inacreditável violência virtual. Sumariamente excluído e
bloqueado em um ambiente de internet apenas porque um dos membros não
concordou com meu texto sobre o Êxodo “Hebreu” do Egito.
Não
declinarei nomes pois a intenção não é acusar, mas convidar todos à
reflexão. Contudo, talvez seja recomendável ler o texto em questão antes
de prosseguir. Clique aqui e forme sua própria opinião.
Após
a postagem, a seriedade do texto foi questionada. A figura de Moisés,
que a maior parte da historiografia e a arqueologia se abstém de
confirmar ou negar a existência, foi taxada de mito, mas nenhuma prova
foi dada desta acusação. Foi dito que o Êxodo contraria as leis da
física.
Minha
formação foi questionada e meu texto foi surpreendentemente acusado de
pregação religiosa. Foi dito que publicações devem ser confrontadas com
outras, no que evidentemente concordo, pois “Julgamos a “precisão” dos relatos dos historiadores vis-à-vis as interpretações de outros historiadores...”1, mas nenhuma confrontação entre textos foi feita e nenhuma prova contrária ao meu texto foi apresentada.
No
meio da argumentação, quando estava escrevendo uma resposta, o post foi
apagado e logo depois eu fui bloqueado. Sem qualquer chance de defesa ou
apelação. Creio, portanto, que a pessoa em questão seja administrador
do ambiente virtual.
http://www.historyplace.com/worldwar2/timeline/einsatz.htm |
O
recurso do bloqueio é um instrumento necessário dentro das redes
sociais. E não questiono o direito de um administrador excluir ou
bloquear um membro.
Meu
questionamento é: um administrador de grupo deve fazer uso desse
instrumento contra um membro apenas por discordar de um texto que não se
encaixa no próprio pensamento? E os demais membros? Não têm direito de
opinar?
O
Reino de Clio é um site feito com muito amor e dedicação. Não dá lucro
financeiro, ao contrário. Mas dá um retorno imensurável em satisfação
pessoal.
É um
site dedicado à História. Mas não àquela História feita para iniciados,
para o clubinho, naquela linguagem acadêmica para ser lida apenas pelos
entendidos.
Nossos
textos são feitos para todos, pois todo mundo adora uma boa História e
as pessoas são assim desde que sentavam ao redor de uma fogueira e
escutavam os idosos contarem seus mitos sobre a criação do mundo e do
homem.
Neste sentido, a História, desde a época dos mitos, tem um papel que é, como bem define MARROU, “...
fornecer à consciência do homem que sente, que pensa, que age, uma
abundância de materiais sobre os quais exerce o seu juízo e a sua
vontade...”2. Note-se que não se discrimina um tipo de homem. O termo homem designado por Marrou é a humanidade inteira.
Fora
do ambiente da sala de aula e dos debates acadêmicos, nosso objetivo é o
prazer da escrita e da leitura, a descoberta do detalhe daquele
personagem ou momento histórico, da possibilidade deste ou daquele
acontecimento ainda não provado. Eis a razão de ser do Reino de Clio.
Neste
espírito, temos recontado várias Histórias e, neste ano de 2015,
estamos dedicados ao Egito Antigo, seus principais faraós, templos,
deuses e o Livro dos Mortos.
Mas,
o sucesso do filme de Ridley Scott (Exodus: Deuses e Reis) e da novela
da Record (Os Dez Mandamentos), nos levou a fazer uma pausa na sub-série
sobre os templos egípcios, introduzindo o Êxodo nas publicações. E por
isso fomos eliminados.
http://www.ft.com/cms/s/2/fdce5cea-ff5f-11e0-aa11-00144feabdc0.html |
Nossa
busca foi verificar se aqueles eventos extraordinários seriam possíveis
dentro das Leis da Natureza, e acreditamos que sim.
Dentro
dessa linha, nossa narrativa, títulos, sub-títulos e postagens podem,
de fato, ter feito uso de frases de efeito e instigações. Mas este é um
recurso válido para atrair a atenção do leitor potencial e “Até o cronista mais empírico precisa criar estruturas narrativas para dar forma ao tempo e ao espaço.”9
Evidentemente
agimos com método. Recorremos a diversas fontes para compor nossos
textos, pois a História, como afirma Lucien Febvre, é “...o estudo, cientificamente conduzido, das diversas atividades e das diversas criações dos homens de outrora...”3. Mas sem perder de vista a linguagem acessível a todos.
Não
aceitamos que o tema Êxodo seja tabu, por ter apenas uma única fonte.
Não estamos escrevendo nenhuma dissertação ou tese mas, apenas,
exercitando nosso direito ao prazer da investigação.
Ademais,
quem disse que uma única fonte não pode servir como inspiração para uma
investigação histórica, quando nas novas modalidades até mesmo
processos criminais podem render obras valiosas?
Quem pode ir contra Jacques Le Goff quando afirma que “... a História se afirma como nova ao anexar novos objetos que até agora lhe escapavam e se situavam fora de seu território.”4. Por acaso é inválido investigar a possibilidade de um acontecimento?
Recentemente
o professor Steve Collins, da Universidade Trinity do Novo México
(EUA), anunciou a descoberta de uma cidade no Vale do Rio Jordão que
pode ser a Sodoma bíblica5. Futuramente isso vai ser comprovado ou não.
Por
acaso isso faz dele um pregador religioso? Sua formação deve ser
questionada pela descoberta que fez? Seu trabalho deve ser escondido do
público, ou eliminado? Ele deve ser demitido da Trinity?
http://www.historyplace.com/worldwar2/timeline/einsatz.htm |
Nossa
intenção jamais foi provar acima de qualquer dúvida que o Êxodo
aconteceu e nem reconstituir totalmente aquele eventual momento pois é
evidente que “...passado e História são coisas diferentes […] existem livres um do outro; estão muito distantes entre si no tempo e no espaço.”6 e “Nenhum
relato consegue recuperar o passado tal qual ele era, porque o passado
são acontecimentos, situações, etc., e não um relato.”7
É evidente também que escrevemos partindo de nossas próprias escolhas e crenças porque “Ninguém, não importando quão imerso esteja no passado, consegue despojar-se de seu conhecimento e de suas pressuposições.”8, mas nosso texto pode ser acusado de tudo, menos de ter um viés religioso.
Cada
texto componente da mini-série Êxodo x História mostra, a partir de
fontes confiáveis, que o Êxodo, se aconteceu (nós acreditamos que sim e
dissemos isso claramente), foi diferente do que diz a Bíblia. Mas mostra
que, dentro das leis da natureza, que incluem as leis da física, seria
possível ocorrer.
É
biologicamente possível um arbusto arder espontaneamente, assim como a
água ficar vermelha, causando fuga de anfíbios e morte de peixes.
Infestações de insetos e pragas de gafanhotos ocorrem em vários lugares,
assim como chuvas de pedras provenientes de erupções vulcânicas.
Esses
fatos são irrefutáveis. Isso é ciência e, portanto, História, pois tudo
é História! Apesar de que BESSELAAR poderia discordar um pouco de tal
afirmação:
... a História não corresponde às exigências da definição escolástica: cognitio rerum per causas,
visto lhe servirem de objeto material os atos humanos, os quais são
contingentes, não necessários, e concretos, não universais. Logo, a
História não é ciência no sentido próprio da palavra, podendo sê-lo
apenas em sentido derivado...10
Contudo,
ciência pura ou derivada, História foi o que fizemos com os textos do
Êxodo. Certamente não definitiva, nem acima de qualquer questionamento,
pois “... a História é determinada pelo ilógico comportamento humano,
e não por grandes leis científicas imutáveis, que está fora do nosso
poder desviar.”11
Por
outro lado nosso texto não foi, absolutamente, de forma nenhuma, uma
pregação de púlpito religioso. Muito ao contrário, e a todos os
momentos, quando mostra a possibilidade natural dos fenômenos narrados
na Bíblia, tiramos deles o caráter arbitrário da intervenção divina.
Esta, ao agir, usou as próprias leis da natureza.
http://www.sott.net/article/244113-The-Medical-Inquisition-and-Human-Rights-Violations-in-21st-Century-France |
Seria
até esperado que, por conta disso, palavras de crítica partissem
daqueles mais aferrados à Bíblia. Surpreendentemente isso não ocorreu,
partindo de onde menos se esperava.
Assim
sendo fica caracterizada, a nosso ver, a arbitrariedade e a
intolerância intelectual contidas no ato unilateral de nos excluir do
ambiente virtual. Por que isso ocorreu?
É
possível que o ato esteja na raiz daquele pensamento iluminista que
descarta tudo que não possa ser materialmente comprovado. Pode-se
concordar ou discordar desse pensamento.
Mas o
bloqueio do diálogo e da exposição do pensamento vai contra tudo o que o
iluminismo lutou em sua gênese e se assemelha muito ao comportamento da
Igreja nos piores anos da Inquisição.
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Inquisition.jpg |
Também
sinaliza que aquele que bloqueia, seja pelo incômodo do contraditório,
seja por insegurança do alicerce das próprias construções intelectuais,
precisa garantir que apenas a sua versão permaneça, conforme bem
desvenda Jenkins:
...os
dominados, tanto quanto os dominantes, têm suas próprias versões do
passado para legitimar suas respectivas práticas, versões que precisam
ser tachadas de impróprias e assim excluídas de qualquer posição no
projeto do discurso dominante.12
Assim
sendo, tal intolerância, que vem se apresentando sob muitas faces em
nosso país ultimamente, precisa ser combatida em todos os ambientes, em
especial no ambiente universitário, físico e virtual, que deve primar
pela pluralidade de pensamentos e versões, na busca por contribuir com
as construções internas individuais.
O
Reino de Clio se posiciona indignado contra o extermínio da visão
diferente e conclama todos os estudantes e profissionais da História
para que reflitam e combatam a intolerância de pensamento em seus
ambientes.
Obrigado.
1JENKINS, Keit. O que é História. A História Repensada. São Paulo: Contexto, 2001.
Todas as citações foram
retiradas da compilação feita para disciplina Intrudução à História de
2007, da UFS, feita pelo Prof.Dr. Francisco Alves.
2MARROU, Henri. A utilidade da História. Do Conhecimento Histórico.Lisboa: ASTER, 1975
3FEBVRE, Lucien. Combates pela História. 2ª Ed. Lisboa: Presença, 1985
4LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre. Apresentação. História: Novos Problemas. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.
5https://br.noticias.yahoo.com/cidade-b%C3%ADblica-pode-ter-sido-encontrada-no-vale-do-jord%C3%A3o-185132680.html
6JENKINS, Keit. O que é História. A História Repensada. São Paulo: Contexto, 2001.
7Ibid.
8Ibid.
9Ibid.
10BESSELAAR, Jose van den. A História é uma ciência moral. Introdução aos estudos históricos. 4ed. São Paulo: EDUSP, 1974
11TUCHMAN, Barbara. A História é um guia para o futuro? A prática da História. 2ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1995
12JENKINS, Keit. O que é História. A História Repensada. São Paulo: Contexto, 2001.
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